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A chegada do Calcário líquido ao mercado promete deixar cenas como esta para trás. Será?

trator-espalhando

Gabriel Barth

Coordenador do setor de Solos
e Nutrição de Plantas da Fundação ABC.

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Na ultima safra, o setor agrícola foi surpreendido com um novo produto "revolucionário" para correção da acidez do solo.
O famigerado "calcário líquido" promete corrigir a acidez do solo melhor que o corretivo da acidez mais utilizado atualmente, o calcário em pó, calcítico ou dolomítico. Mas, como isso seria possível? Ou qual é a base teórica que sustenta essa proporção?
Primeiro, vale lembrar que tal tecnologia está sendo comercializada sem um aval científico, ou seja, essa tecnologia não saiu de nenhuma instituição de pesquisa e somente está sendo veiculada por algumas empresas no Brasil, no que se diz respeito ao seu estudo como corretivo da acidez do solo.

A explicação estaria no uso de nanotecnologia, ou seja, tais empresas teriam um processo industrial onde conseguem transformar partículas normais de corretivos, à base de carbonatos (como o calcário) ou de oxidos (como a cal) de Ca e/ou Mg em nanoparticulas que são partículas muito finas. Só para ter se idéia, um nanômetro seria um (1,0) milímetro dividido em um milhão de partes. Essas partículas muito pequenas teriam uma reação muito mais rápida no solo comparado ao calcário atualmente utilizado e sabidamente com baixa solubilidade em água.

Tais empresas, trabalhando com essas proporcionalidades de tamanho de partículas e de possível correção da acidez, chegaram a uma proporção de que 5,0 litros do "calcário líquido" seriam tão ou mais eficientes que uma tonelada (1.000 kg) de calcário em pó. A maior vantagem, nessa condição, seria a facilidade de aplicação, pois as partículas de corretivos nessas formulações líquidas são solúveis, pela adição de agentes e pelo tamanho das partículas, de modo que a aplicação poderia ser realizada com pulverizador e não mais com a "calcareadeira".
Considerando que a aplicação de calcário não é uma prática confortável de se realizar, seja pelo pó liberado ou pela dificuldade de manejo com pá carregadeira, equipamentos sem boa regulagem etc., tal produto seria "uma mão na roda" para o produtor na correção da acidez do solo.

Mas, volto à questão da proporcionalidade: a quantidade de corretivo contida em 5 litros de produto é em torno de 250 vezes menor que em uma tonelada de calcário. Mesmo considerando a maior reatividade, seja pelo tamanho das partículas ou pela fonte de Ca (oxido), a quantidade de corretivo aplicada na lavoura é irrisória.

A baixíssima quantidade de corretivo aplicada promove uma correção insignificante da acidez do solo, como pode ser observado na Tabela 1, abaixo, resultante de trabalho a campo (um dos primeiros trabalhos científicos dessa tecnologia no Brasil) realizado pela Fundação ABC no Campo Experimental de Ponta Grossa-PR. Os resultados mostram os efeitos da aplicação de calcário em pó e duas fontes de calcário liquido, em comparação a não aplicação de corretivo. Como a dosagem do calcário foi de 2,5 t/ha, manteve-se a proporção de 5L/t, resultando na aplicação de 12,5 L/ha de "calcário líquido". Após cinco meses da aplicação dos corretivos na superfície, observamos que o calcário corrigiu totalmente a acidez na camada de 0-5 cm (correção do Al e aumento do pH e dos teores de Ca e Mg, SB e V%) e com tendência de correção nas camadas de 5-10 e 10-20 cm (observar coluna m —saturação por Al). Já os tratamento com calcário liquido não tiveram qualquer efeito na correção do solo, independentemente da camada de solo avaliada.

Esse resultado está de acordo com o cálculo teórico (estequiométrico) realizado para calcular o quanto de calcário seria necessário para corrigir certa quantidade de acidez. Sabe-se que para cada 10 mmolc/dm³ de H+Al ou Al³⁺ é necessário 1.000kg de calcário (considerando-se calcário puro ou somente CaC03 ou MgC03 e reação perfeita ou sem perdas). Ou seja, com quantidades muito pequenas de corretivo não se tem como proporcionar efeitos significativos na correção do solo, por mais eficientes que sejam.

Alertamos os produtores para não utilizarem tal tecnologia da forma recomendada pelo fabricante, pois não tem viabilidade técnica nessas condições de uso, e ficarem atentos aos valores investidos, pois proporcionalmente custa mais caro que o calcário convencional.

Mesmo não sendo a prática agrícola mais agradável, o velho e bom calcário ainda é o melhor corretivo da acidez do solo.

 

tabela1


Materia publicada na revista abc de julho de 2013, ano 2, edição 7.

 

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Sociedade Brasileira de Ciência do Solo
Núcleo Estadual Paraná

Antonio Carlos Vargas Motta ¹
Luís César Cassol ²
Volnei Pauletti ³

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RECENTEMENTE, o Núcleo Estadual Paraná da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo foi procurado para manifestar, através da sua Comissão Especializada em Fertilidade do Solo, opinião sobre a oferta no mercado de CALCÁRIO LÍQUIDO, devido a informações divulgadas no campo de que o uso de um litro deste equivale à aplicação de 1000 kg de calcário, que a reação do calcário em pó aplicado no solo é de apenas 1-2%, que a eficiência do calcário em pó é de apenas 30%, entre outras. Tais afirmações são descabidas, desrespeitosas com a ciência e, no mínimo, irresponsáveis.

Este texto tem a função de ALERTAR E INFORMAR aos usuários e recomendantes sobre alguns aspectos que envolvem a calagem no Estado do Paraná, que tem solos, em sua maioria, naturalmente ácidos.

A classe agronômica há muito tempo vem trabalhando para que o uso de adubos e corretivos da acidez se torne uma realidade na agricultura brasileira e Paranaense. O aumento expressivo, em tempos recentes, de produção e produtividade certamente se deve ao uso adequado dos corretivos da acidez. Mas o uso sem controle e em quantidade acima ou abaixo do recomendado pode trazer decréscimo na produtividade, sendo necessário o acompanhamento periódico da fertilidade através de análises de solo.

As FUNÇÕES DO CALCÁRIO são aumentar o pH e neutralizar o Al e fornecer grande quantidade dos nutrientes Ca e Mg, pois seus principais componentes são o CaCO₃ e o MgCO₃. Em função disso, a forma como o calcário é aplicado no solo (liquido ou sólido) não importa, desde que respeitadas as proporcionalidades em relação à eficiência na correção da acidez e quantidade de nutrientes.

Os calcários são normalmente vendidos na forma de pó, são pouco solúveis em água e sua velocidade de reação depende do tamanho das partículas que o compõe. Menor tamanho determina maior contato com a água e solo, aumentando a VELOCIDADE DE REAÇÃO. Normalmente, em uma tonelada de calcário de boa qualidade se tem mais de 50 % de partículas menores que 0,3 mm, que reagem em menos de um mês no solo, quando bem misturado e com umidade adequada. Portanto, caso o calcário seja moído mais fino poderá aumentar a velocidade de reação, mas sua eficiência pouco mudará. Isto porque, a eficiência do calcário é dependente de outro fator, além da GRANULOMETRIA (tamanho das partículas), que é a PUREZA QUÍMICA.

Para saber QUANTO DO CALCÁRIO REAGE após a aplicação no solo, foi criada uma unidade chamada de PRNT (Poder Relativo de Neutralização Total) que é calculado considerando a granulometria e a pureza química do material. A pureza química dos calcários
geralmente é próxima a 90%. Um calcário de PRNT = 100 % indica que 100% do material do calcário reage em até dois anos. Se o PRNT for de 72%, por exemplo, significa que 80% do calcário irá reagir em até 2 anos (80% de 90% de calcário puro = 72% de PRNT). Portanto mesmo que o material tenha 100% de reação devido ao tamanho das partículas, ainda assim teríamos um limite da pureza que é 90% (100% de 90% de calcário puro = 90% de PRNT).

Os valores de PRNT indicam quanto do calcário reagirá em dois anos, se todas as condições forem favoráveis a isso. O restante levará mais tempo que estes dois anos, mas também irá reagir no solo, corrigindo a acidez e fornecendo Ca e Mg. Portanto, aplicações sucessivas de calcário, de acordo com as recomendações técnicas, levam a uma eficiência de 100% após a segunda ou terceira aplicação nos anos subsequentes.

Só para reforçar, caso um produtor de calcário (indústria) diminua ainda mais o tamanho das partículas de calcário, ele permitirá uma maior velocidade de reação mas não aumentará a eficiência do corretivo. Ou seja, dizer que um CALCÁRIO MUITO MAIS FINO que o calcário existente no mercado é mais eficiente na correção da acidez do solo é um grande equivoco. Dizer que um calcário com partícula de 200 Angstrom é mil vezes mais eficiente que um com partícula de 200.000 Angstrom não está certo. Caso o calcário seja comercializado na forma liquida, certamente as partículas mais finas serão mais fáceis de manter em suspensão na água e com isso facilitar a aplicação do produto, mas só isso.

O PRNT mínimo para um calcário ser comercializado é 45%, ou seja, de cada 1000 kg de calcário aplicado no solo, cerca de 450 kg deve reagir em dois anos. Logo, uma informação de que somente 10 ou 20 kg em cada tonelada dos calcários existentes no mercado reagem no solo, ou seja, 1 a 2%, certamente não é coerente. Um CUIDADO importante que o agricultor deve ter é verificar se o produto é comercializado como adubo/fertilizante ou como corretivo de acidez. Quando utilizado em baixas doses, a legislação vigente não impede que o produto seja comercializado como fertilizante fornecedor de Ca e Mg. Isso, no entanto, é bem diferente que recomendar um produto para substituir o calcário. Quando se aplica 3 a 15 litros de um produto contendo 20% de Ca e 20% de Mg (com densidade do produto de 1 kg L-¹), por exemplo, se estará aplicando entre 0,6 a 3,0 kg de Ca e entre 0,6 a 3,0 kg de Mg. Valores bem menores se comparados à aplicação de uma tonelada de um calcário com 30% de CaO e 10% de MgO, quando se estará aplicando 210 kg de Ca e 60 kg de Mg. Portanto, a quantidade de Ca e Mg aplicada com até 15 litros do calcário liquido, não atende sequer a EXIGÊNCIA DA PLANTA para produzir uma tonelada de grãos de culturas importantes como a soja, milho e feijão.

A aplicação na forma fluída pode ser vantajosa ao produtor nos ASPECTOS PRÁTICOS que envolvem a operação de calagem entre as quais: não forma pó, homogeneidade de aplicação e menor uso de mão de obra. Também pode trazer algum beneficio em caso de solo ácido e que não recebeu calagem, quando aplicado na linha, a semelhança dos resultados obtidos com a aplicação de calcário filler na linha em campo bruto/nativo. Essas vantagens podem convencê-lo a usar o produto, no entanto traz riscos muito sérios à manutenção da produtividade das espécies cultivadas. O uso de baixas doses de um produto substituindo o calcário poderá esgotar o efeito residual das calagens feitas anteriormente e em 4 a 5 anos podemos encontrar no Paraná baixas produtividades devido a acidez do solo.

Concluindo, não há argumentos que sustentem que o uso de um kg de um calcário muito fino na forma de pó ou misturado a um líquido poderia substituir uma tonelada de calcário comercial ao ser aplicado ao solo com finalidade de elevar o pH, diminuir o Al tóxico ou fornecer Ca e Mg. O desempenho da agricultura brasileira, ao tornar-se um dos maiores produtores mundiais de alimento, foi baseado em estudos que envolveram e envolvem técnicas diversas de manejo do solo. Sem dúvida a calagem é uma das mais importantes. Divulgar a idéia de que é possível substituir esta técnica por outra sem comprovação científica e, pior, por um produto ou dose muito aquém da necessária para os objetivos principais do uso do calcário, é sem dúvida uma IRRESPONSABILIDADE e um desserviço ao País.

1 Professor de Fertilidade do Solo - UFPR, Curitiba - PR;
2 Professor de Fertilidade do Solo -UTFPR, Pato Branco - PR;
3 Professor de Nutrição Mineral de Plantes - UFPR, Curitiba - PR.


Veja também:

http://www.campograndenews.com.br/artigos/calcario-liquido-geracao-espontanea-ou-milagre

http://www.iac.sp.gov.br/noticiasdetalhes.php?id=828

http://unisafeconsultoria.com.br/noticia.php?id=298&titulo=Alerta-sobre-uso-do-Calc%C3%A1rio-L%C3%ADquido


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